Você já foi trabalhador rural alguma vez na sua vida, mas hoje já não trabalha mais? Continuou a trabalhar, mas em ambiente urbano?

Se a resposta foi sim, você pode ter direito a aposentadoria híbrida?

A aposentadoria híbrida é justamente para trabalhadores que já exerceram atividade laboral rural em algum momento da vida, mas já não mais exercem a profissão em ambiente rural. 

Significa que o período de trabalho rural deve ser computado para fins de aposentadoria, mesmo que você continue a trabalhar em ambiente urbano. 

Confira como funciona a seguir e como a Reforma da Previdência influenciou na aposentadoria híbrida.

A aposentadoria híbrida: aposentadoria rural e urbana

A aposentadoria híbrida ou por idade híbrida é um benefício concedido ao segurado que alcança idade mínima e tempo de contribuição mínimo, que consiste na soma do tempo de exercício de atividade laboral rural em parte da vida e urbana em outra parte. 

Ou seja, é um benefício previdenciário por idade misto (pois o tempo de contribuição é a soma do tempo rural e urbano) cujos requisitos são previstos em lei.

É comum principalmente àqueles trabalhadores que iniciaram a atividade laboral rural muito novos, com 18 anos de idade, por exemplo, mas poucos anos depois decidem se mudar para a cidade, a fim de trabalhar de forma diferente em busca de oportunidades.

Neste exemplo, o registro do período trabalhado em carteira (CTPS) consta somente o período de exercício laboral urbano, já que não há formalidade no trabalho rural, em regra. 

Por muito tempo, tais trabalhadores buscavam o poder judiciário, a fim de que o período de trabalho rural fosse considerado para cômputo na soma dos períodos de contribuição ao INSS. 

Assim, foi promulgada a Lei nº 11.718, em 2008, que alterou o artigo 48 da Lei da Previdência Social (Lei 8213/91), adicionando o parágrafo terceiro, que prevê a aposentadoria por idade híbrida.

Mas não é somente destinado a tais trabalhadores a aposentadoria híbrida, haja vista que vale para qualquer pessoa que trabalhou certo período de tempo em propriedade rural e outra parte exerceu atividade laboral urbana. 

A aposentadoria é benéfica justamente porque, sem o reconhecimento do tempo de atividade rural, o segurado teria que continuar trabalhando por muito mais tempo para conseguir se aposentar, ou seja, até conseguir o tempo de contribuição mínimo previsto em lei.

Para que o segurado consiga obter a aposentadoria híbrida, precisará comprovar o tempo de trabalho rural e urbano.

O rural pode ser comprovado mediante recibos, contratos, testemunhas, histórico escolar em instituição de ensino rural. 

O urbano pode ser comprovado por contratos de trabalho, registros em carteira de trabalho, guias da previdência social e etc.

A Reforma da Previdência muda a aposentadoria híbrida?

A Reforma da Previdência (Emenda Constitucional 103/2019) mudou a aposentadoria híbrida, haja vista que a idade mínima exigida por lei, para que o segurado possa se aposentar, aumentou. 

Antes da publicação da nova lei, que entrou em vigor em 12 de novembro de 2019, os requisitos para aposentadoria por idade eram:

Com a vigência da Reforma, os requisitos para a aposentadoria híbrida passaram a ser:

Idade para se aposentar 

A aposentadoria híbrida é, conforme dissemos acima, um benefício por idade que soma o tempo de contribuição da atividade rural com a urbana.

Assim, conforme a lei, é preciso cumprir os requisitos idade e tempo de contribuição. 

Com a Reforma, a idade aumentou para as mulheres, sendo 62 anos de idade para elas. Para os homens, a idade se manteve em 65 anos. 

A aposentadoria por idade rural exige idade mínima inferior em comparação com a urbana e isso não sofreu alteração com a Reforma da Previdência. Na rural, a idade mínima é de 60 anos de idade para homens e 55 anos para mulheres.

No entanto, a aposentadoria híbrida é recomendada quando o tempo de atividade rural e idade não são suficientes por si só para o segurado conseguir o benefício exclusivamente rural ou o tempo de contribuição relativo à atividade laboral urbana não é suficiente para a concessão da aposentadoria por idade comum. Neste caso,, é recomendado buscar somar o tempo de atividade rural com a urbana para obter a aposentadoria híbrida. 

Tempo de contribuição

O tempo de contribuição exigido pela nova norma manteve os 15 anos de contribuição para as trabalhadoras e aumentou para 20 anos aos trabalhadores homens.

Lembrando que na aposentadoria híbrida a contagem do tempo é a soma do tempo de trabalho rural com o urbano. 

Outras alterações

A contagem do tempo de contribuição sofreu alteração.

Antes, eram contados dias quebrados, por exemplo, três anos, dois meses e 14 dias. Agora, conta-se mês a mês, de forma arredondada.

O valor da aposentadoria também sofreu mudanças no cálculo. 

Antes da Reforma, o cálculo era correspondente à média aritmética de 80% dos maiores salários recebidos em vida pelo trabalhador. 

Após a Reforma, o cálculo passou a ser a partir da média aritmética de 100% dos salários recebidos em vida, incluindo os menores, deste valor, com acréscimo de 2% a cada ano que exceder 15 anos de contribuição para mulheres e 20 anos para homens.

O valor da aposentadoria é 60% da média aritmética. Nas antigas regras, era de 70% da média. 

Existem regras de transição para aposentadoria híbrida?

A regra de transição é aquela aplicável aos trabalhadores que estavam próximos de se aposentar de acordo com as regras da lei antiga, quando a lei nova entrou em vigor. 

Logo, com a vigência da Reforma da Previdência (em 13 de novembro de 2019) a regra de transição compreendia que, a cada ano, a partir de 2020, aumentaria em 6 meses a idade mínima para as mulheres, ou seja:

Quanto ao tempo de contribuição, aos homens que já eram contribuintes antes da vigência da Reforma, poderiam cumprir os 15 anos de tempo mínimo como regra de transição. 

No entanto, com a publicação do Decreto Lei 10.410/2020, alterando o DL 3.048/99, deixou de existir a regra de transição para a aposentadoria híbrida, tornando permanente as regras da Reforma da Previdência.

Assim, não há mais regra de transição aplicável à aposentadoria híbrida, devendo as mulheres alcançarem 62 anos de idade e os homens 20 anos de tempo de contribuição.

Entraves com as alterações da Reforma da Previdência

Com a vigência do Decreto Lei 10.410/2020, alguns questionamentos surgiram por juristas especialistas, pois a impossibilidade de se aplicar a regra de transição aos segurados que pretendiam a aposentadoria híbrida é notoriamente, aos olhos dos profissionais, inconstitucional. 

Ou seja, a limitação do Decreto Lei nº 10.410/2020, que torna permissiva a regra de transição apenas à aposentadoria por idade comum e não à híbrida não é justificável, já que a Lei 8213/91 continua vigente em seus exatos termos e mantém as regras para a aposentadoria híbrida.

Assim, o referido Decreto Lei não tem – ou não deveria – prevalecer sobre a Lei da Previdência Social vigente, não devendo ser impossibilitada a regra de transição aos trabalhadores híbridos. 

Tal posicionamento pode interferir nos pedidos de aposentadoria e, inclusive, motivar pedidos judiciais para o reconhecimento da regra de transição em relação à aposentadoria híbrida,  já que os efeitos do Decreto Lei não deveriam ser superiores aos da própria lei. 

Tema 1104 STF e a Aposentadoria Híbrida

O tema 1104 do STF foi colocado em pauta em razão de recurso interposto pelo INSS contra uma decisão proferida pelo STJ desfavorável ao órgão. 

Para você entender, é preciso explicar a controvérsia gerada em sede recursal pelo INSS em um caso concreto.

Pois bem. 

O STJ decidiu, em tese motivada por recurso interposto pelo INSS, que o trabalhador rural que exerceu a atividade laboral antes do ano 1991 tem direito ao reconhecimento do tempo rural trabalhado, se comprovado por meios hábeis, mesmo que sem contribuição efetiva ao INSS ou sem registro em carteira de trabalho. 

O tempo rural do trabalhador reconhecido, mesmo sem contribuição efetiva ao INSS, é válido para somar ao tempo de atividade laboral urbana para alcançar 15 anos de tempo de contribuição, requisito para a aposentadoria por idade híbrida.

Na mesma linha, o STJ entendeu que o trabalhador não precisa ter exercido a atividade rural imediatamente antes de requerer o benefício da aposentadoria híbrida, tendo em vista que, em boa parte dos casos, o trabalhador rural iniciou a vida laboral rural e depois partiu para a cidade em busca de melhores condições de vida, consequentemente trabalhando em atividade urbana. 

Até mesmo porque o surgimento da Lei em 2008 que estabeleceu a aposentadoria híbrida diz respeito aos trabalhadores que iniciaram a atividade laboral rural e depois passaram a exercer a urbana. Exigir que o trabalhador rural estivesse exercendo atividade laboral logo antes do requerimento da aposentadoria seria, segundo o STJ, o mesmo que reconhecer a inutilidade da aposentadoria híbrida.

Ou seja, todos os questionamentos do INSS foram rejeitados em recurso. O órgão não conformado, interpôs recurso ao STF, gerando o tema 1104, que não foi julgado, haja vista que não se tratava de tema que violava questão constitucional. Portanto, resta válido o posicionamento do STJ até o momento. 

Importante esclarecer que o Decreto Lei 10410/2020, que citamos no tópico anterior, foi publicado justamente para alterar o artigo 57 do Decreto Lei 3.049/99, passando a dispor expressamente que o trabalhador tem direito à aposentadoria híbrida mesmo que, na data do requerimento do benefício, ele não esteja mais exercendo a atividade laboral rural. 

A consequência do referido Decreto Lei 10410 recaiu, no entanto, sobre a regra de transição da Reforma de Previdência, que deixou de ser válida aos trabalhadores que pretendiam a aposentadoria híbrida, tornando-se permanentes as regras da nova lei. 

Como evitar problemas para conseguir a aposentadoria híbrida

Com a problemática que surgiu após o Decreto Lei 10420/2020 e os efeitos na regra de transição da Reforma da Previdência, os trabalhadores precisam  considerar planejar a aposentadoria de acordo com o tempo de atividade rural e urbana, para não suportarem os prejuízos. 

Isso porque, para cumprir os requisitos da aposentadoria híbrida conforme as novas regras, as mulheres devem alcançar idade mínima de 62 anos e os homens devem cumprir 20 anos de tempo de contribuição, o que provavelmente irá acarretar alguns anos a mais de trabalho. 

É importante avaliar cada caso em concreto, a fim de confirmar qual é a aposentadoria mais benéfica, já que a aposentadoria por idade comum, nos termos das regras de transição ainda vigentes, podem ser melhores para estes trabalhadores. 

De toda forma, é importante que os trabalhadores que têm direito à aposentadoria híbrida busquem orientação jurídica com advogados especialistas a fim de evitar saírem prejudicados com as novas regras.

Tem dúvidas sobre o assunto? Deixe seu comentário ou entre em contato, será um prazer lhe orientar.

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Patrícia Würfel

Advogada e mãe. Especialista em Direito Previdenciário. Apaixonada por fazer a diferença na vida das pessoas. Atua no sentido de verificar e orientar os segurados do INSS sobre o melhor momento para suas aposentadorias.